Fotos: Gerson Klaina/Tribuna do Paraná.
Publicado originalmente no site do jornal TRIBUNAPR, em 19 de agosto de 2019
Clássico em Curitiba, Cine Morgenau completa 100 anos com
programação especial!
Jogaram até um gato no telão, o Robocop veio dos Estados
Unidos para passar algum tempo aqui e o padre entrava escondido no salão. Estas
e outras grandes histórias marcam os 100 anos do Cine Morgenau, completados
nesta segunda-feira (19), em Curitiba. O tradicional cinema entra no centenário
valorizando a paixão da “Sétima Arte” e o valor das famílias que idealizaram um
sonho que virou realidade na vida de curitibanos de várias gerações.
O início de tudo foi em 1919, quando Bernardo Quickstedt
teve a ideia de colocar algumas cadeiras e um projetor em um salão na Sociedade
Morgenau. O objetivo era movimentar a comunidade nos dias em que o clube não
tinha os tradicionais bailes que levavam a sociedade curitibana para a Avenida
Souza Naves, no Bairro Cristo Rei. O fascínio pelos filmes e o glamour de estar
em um tradicional ponto de encontro da cidade já mostravam que o caminho seria
positivo para os apoiadores desta causa.
Na década de 20 e o Cine Morgenau ganhou notoriedade ao
virar ponto de encontro, de influência e até de status de quem o frequentava.
Para entrar no local, o cliente tinha que estar alinhado aos costumes da época
com a vestimenta em ordem, sapatos limpos, terno e chapéus da moda. Sem citar
que o homem não podia pensar em “avançar” o sinal com a moça. Foi nesta época
que surgiu nos cinemas a figura do lanterninha, que tinha a árdua missão de
controlar os mais assanhados.
Mesmo com o sucesso de público, o Cine Morgenau mudou de
local. Em 1931, deixou a Souza Naves e foi para a Rua Schiller, ainda no Cristo
Rei. Para os entendidos do bairro, a mudança foi fundamental e a época de Ouro
bateu na porta. A equipe do fundador Bernardo Quickstedt aumentou e três irmãos
da família Souza começaram a mostrar que o futuro estaria em boas mãos.
Mudança de dono!
Trinta anos se passaram e Bernardo Quickstedt decidiu passar
o cinema para algum interessado. Os irmãos Souza (Erasmo, Jorge e Joaquim)
trabalhavam e conheciam o dia a dia do estabelecimento e montaram uma
estratégia financeira para adquirir os direitos de seguir com Cine Morgenau.
“Ficamos trabalhando normalmente até 1960 quando arrendamos definitivamente o
local do Bernardo, fundador do cinema. Vale ressaltar que tínhamos outro
emprego e não era moleza. Ficava até tarde com as sessões noturnas, mas foi
válido por tudo. A relação com as pessoas e com a cidade de Curitiba
aumentava”, disse Erasmo de Souza, um dos proprietários da época.
Na década de 80, vários cinemas estavam localizados no
centro da cidade e naturalmente atraíam a clientela. Lido, São João, Astor,
Ritz, Luz, Palace Itália, Vitória, Condor, Bristol e Plaza tinham até a
preferência, mas um pedido alterou o rumo do Morgenau. O prefeito Jaime Lerner
tinha o desejo de ter uma casa de eventos na Praça Rui Barbosa e a segunda
alteração de sede ocorreu. Ali também o perfil do púbico foi alterado para
sempre.
Filmes adultos!
A programação dos filmes no Morgenau seguia normalmente e
para todos os públicos. Para exibir os filmes estrangeiros, era comum os
cinemas terem uma relação de amizade e o Cine Plaza era parceiro do Morgenau.
Em 1983, a atração no fim do ano era o filme Retorno de Jedi, que prometia
levar muita gente para as salas. “Esta relação com o Plaza alterou todo o
mercado curitibano. Cinco semanas o filme ficava conosco e cinco com eles. Com
tanta exibição, a cópia foi dando problema e a qualidade foi piorando. O pessoal
do Plaza culpava a gente que tinha estragado e vice-versa. Era engraçado até”,
relembrou Erasmo.
No período em que o filme estava no Plaza, os proprietários
do Cine Morgenau chegavam a exibir filmes infantis. Mas na frente do próprio
cinema, uma fila chamava a atenção. Uma pequena sala exibia filmes adultos e a
partir daquele momento, o público seria alterado radicalmente. “Era entranho a
gente colocar infantil e eles com um filme bem diferente. Colocamos o filme
“Garganta Profunda” e foi um grande sucesso. Ficamos com 12 semanas lotado e
decidimos acreditar neste produto que dura até hoje”, ressaltou Erasmo.
Em 100 anos de cinema, muitas histórias ocorreram dentro da
sala. O primeiro beijo de vários casais, pedido de casamento, parto e até um
gato lançado no telão. “Uma vez um rapaz entrou com um gato escondido e jogou
na direção da tela. Já imaginou a cena? Ainda lembro de um sábado de Aleluia
quando colocaram uma cerca em redor do cinema e botaram uma vaca no meio.
Ninguém entrava e o Judas estava pregado. No Cine Morgenau até os padres
entravam pelos fundos, pois era proibido”, relembrou o antigo proprietário.
Quantos aos filmes com maior bilheteria, nada se compara a
Paixão de Cristo. Por vários anos e até mesmo já no período de cine para
adultos, a película é exibida na Sexta-Feira Santa. “Perdemos a quantidade de
vezes que exibimos Paixão de Cristo. A relação nossa e muito forte e mantemos a
tradição de exibirmos antes da Páscoa”, finalizou Erasmo.
Morte de mentor
A morte de Jorge de Souza, um dos proprietários em 2009
causou uma enorme desconfiança na continuidade do Morgenau. Para muitos que
conviviam com a família, era o momento de fechar a cortina e esquecer a
história. No entanto, o filho assumiu o controle e mesmo no momento de tristeza
conseguiu ter força para permanecer com o objetivo, que era de chegar aos 100 anos
do cine. “Todos apostavam que ia fechar. O sonho dele era fazer a festa de cem
anos e não conseguiu, pois morreu com 80. Mas até como promessa, o cinema da
família vai chegar ao centenário. Não importa o que aconteça daqui alguns anos,
mas estamos vivos. Eu não sei como vou estar nesta segunda-feira, mas acho que
vai ser complicado, pois iremos pensar naqueles que se foram”, afirmou Jorge
Luiz de Souza Filho.
Personalidades
O cinema atrai todos os públicos e algumas personalidades
passaram pelas poltronas do Cine Morgenau ou até pela entrada. O desenhista
curitibano Poty Lazzarotto chegava a desenhar no portão. “Meu pai sempre falava
que o Poty ficava lá na frente rabiscando algumas coisas. O Paulo Leminski
falava que ia para espairecer a cabeça. Até o Robocop dos Estados Unidos chegou
por aqui”, confirmou o atual proprietário. O Cine Morgenau ainda alterou de
local por mais duas vezes. A terceira sede foi na Avenida João Gualberto,
próximo à Praça 19 de Dezembro. Atualmente, está localizado na Conselheiro
Laurindo, no Centro. Uma sala de aproximadamente 40 lugares, um telão com
tecnologia digital e filmes para adultos são exibidos sem interrupção das 10h
até 20h no preço de R$15.
Queda de bilheteria!
A venda de imóveis para igrejas e a entrada dos cinemas em
shoppings acabou mudando radicalmente o cenário. Além disto, com o avanço da
tecnologia, os filmes estão cada vez mais perto do consumidor e a tradicional
passada no cinema ficou em segundo plano. “Depois que surgiu o videocassete,
DVDs e a internet, o cinema de rua perdeu demais. Hoje em dia para se manter é
difícil. Estamos aqui para manter o local vivo. Posso dizer que não trabalho
somente com o cinema, pois tenho outras profissões. Alguns objetos antigos
nossos foram doados como filmes, livros e cartazes que estão no Museu da Imagem
e do Som de Curitiba”, comentou Jorge Luiz.
Programação de Aniversário
A programação para esta segunda-feira, dia em que o local
completa 100 anos, conta com a exibição de filmes clássicos a partir das 15h
com entrada gratuita. Mazaroppi, Charles Chaplin, Tarzan, Gordo e Magro e
desenhos. No período noturno, um coquetel para convidados irá celebrar os cem
anos do Cine Morgenau.
Texto e imagens reproduzidos do site: tribunapr.com.br
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