Ivo Raposo.
Por Renata Moreira Lima
Fotos: Renata Moreira Lima e divulgação
Quem viu o clássico Cinema Paradiso vai encontrar
semelhanças entre a história do filme e a vida do advogado Ivo Raposo. Morador
de Copacabana, esteve à frente da 12ª e 13ª delegacia do bairro, mas era pelo
cinema que o ex-delegado manifestava sua grande paixão. Nascido na Tijuca e
frequentador do antigo cinema Metro, ficou com o parte do acervo do cinema e
montou o Centímetro (um mini Metro) no quintal da casa em Conservatória,
interior do estado do Rio de Janeiro. Hoje, o local faz parte do festival
Cinemúsica, que acontece todo ano naquela cidade.
Confira na entrevista um
pouco mais da história curiosa do vizinho Ivo Raposo.
Jornal Copacabana: Você foi delegado em Copacabana por quase
15 anos. Como vê a transição da sua fase recente e o bairro agora com a criação
e instalação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs)?
Ivo Raposo: Durante muitos anos, Copacabana foi agraciada
pelo governo por ser um bairro turístico, conhecido internacionalmente, sempre
houve uma preocupação grande com a segurança no bairro, que tem duas delegacias
e um batalhão de polícia. As UPPs nas comunidades carentes de Copacabana e Leme vieram
somar para a melhoria da segurança no bairro, coroando a idéia de que tem que
haver segurança em Copacabana, sem esquecer da Zona Norte!
J.C.: Com a saída do bairro você parou com as atividades na
polícia?
I.R.: Tenho 38 anos de profissão. Hoje estou na 10ª
Coordenadoria Regional de Polícia do Interior, em Barra do Piraí. Toda vez que
há necessidade de operação por lá, fico à disposição. Felizmente as delegacias
do interior não sofrem com os altos índices de criminalidade.
J.C.: Como a estratégia para instalação das UPPs se deu de
maneira pacífica, alguns infratores teriam migrado para o interior. Como está a
situação em Barra do Piraí e região?
I.R.: Não temos evidências de que houve migração dos
infratores para aquela área. Os índices de criminalidades de lá não sofreram
alteração depois da instalação das UPPs na cidade do Rio de Janeiro. Mas
estamos sempre atentos a esse ponto para que não aconteça.
J.C.: Mesmo atuando na Polícia você tem uma ligação direta
com o cinema. Como surgiu o interesse por esse assunto?
I.R.: Meu pai era detetive, se aposentou após 44 anos de
serviço. Vivenciei aquele ambiente da vida de um policial, nasci respirando a polícia! A explicação está na evolução, ao longo do tempo, mas gosto
de cinema desde criança. Dos 12 anos aos 18 anos fui projecionista de um cinema da
Igreja Santo Afonso, na Tijuca. Quem viu o filme Cinema Paradiso, viu a
história da minha vida! (risos). Era muito legal! O padre fazia censuras e eu cortava os
fotogramas. (risos). Trabalhei por hobbie durante esse tempo, pois não ganhava
muito dinheiro e, se continuasse nesse ramo, não ganharia nunca! Solitário na cabine, fazia as tarefas do colégio, me formando
com tranqüilidade no segundo grau e parei com a atividade no cinema quando
entrei para a faculdade de Direito, já pensando em seguir a carreira na
polícia.
J.C.: Como reencontrou essa paixão?
I.R.: Parei com a atividade de projecionista, mas ela não
saiu do meu coração e da minha vida! Terminei o curso de direito e fiz concurso
para Comissário de Polícia (Delegado da época). Foi aí que o amor pelo cinema
começou a me fazer bem, era uma válvula de escape da tensão de trabalhar na
polícia. Eu extravasava com o cinema! Era o sonho e a realidade. A polícia lida
com o que há de pior na sociedade, o cinema reduzia o meu desgaste. A minha paixão é tanta que minha filha seguiu para esse lado
do cinema.
J.C.: Como conseguiu o material do Cinema Metro e como surgiu
a idéia de criar o Centímetro (uma miniatura do Metro) na cidade de
Conservatória?
I.R.: A minha paixão pelo cinema não se limitava a assistir
aos filmes, queria saber do processo, que máquina era essa que mexia com o
nosso lúdico. Tem cineasta hoje em dia que nunca viu um projetor de cinema! Quando trabalhei como projecionista, lidava com o pessoal da
Metro e de outras companhias. Quando o cinema Metro da Tijuca fechou, pensei
que, infelizmente, o material cinematográfico poderia ter um fim trágico e
comecei a pedir para ficar com o que sobrou dele. O curador daquela massa
falida tentou vender para o ferro velho, mas não era ferro, ele não conseguiu e
acabou entendendo que o material poderia ficar comigo. Levei para a casa do meu
pai em Conservatória, restaurei algumas peças, ainda fiquei com poltronas e
tapetes do Metro. Resolvi refazer o cinema em Conservatória.
J.C.: Assim lançou o Centímetro?
I.R.: Eu jamais conseguiria o espaço do tamanho que era o
Metro. Por isso criei o Centímetro! (risos).
J.C.: É aberto para o grande público?
I.R.: Na verdade fiz para os amigos e família, mas hoje
tenho um acordo com os hoteleiros da região e fazemos sessões demonstrativas
para os visitantes que estão hospedados nos hotéis de lá. É no quintal da minha
casa e agora faz parte do roteiro turístico.
J.C.: Conservatória, que já tinha um turismo artístico
através das serestas...
I.R.: Pois é. Por isso entrei com o Centímetro no evento
Cinemúsica, que acontece todo ano. A quinta edição será em setembro. Sempre
colocamos duas telas nas praças da cidade, mais o Centímetro para apresentar os
filmes durante o festival e fazemos premiações. A música e o cinema são
acompanhados de gastronomia. Todo ano convidamos chefes de restaurantes do Rio
para darem um charme a mais ao evento.
J.C.: Gosta, acompanha e incentiva o cinema. Como vê o
processo cinematográfico brasileiro?
I.R.: A indústria nacional teve um “boom” nos últimos anos,
com leis de incentivo estimulando recursos para realização de filmes de
qualidade. Evoluiu e aprimorou suas técnicas. Hoje entendemos os diálogos, sob
esse aspecto, melhorou muito. Aliado ao sistema digital, até pelo custo
benefício, a tendência é a extinção da película.
J.C.: Sendo assim, você tem mais uma relíquia!
I.R.: É! (risos). E o Centímetro vai ganhando cunho de
Museu.
J.C.: Nasceu na Tijuca, tem o Cinema em Conservatória,
trabalha em Barra do Piraí, como veio morar em Copacabana? Como divide o seu
tempo?
I.R.: Cresci na Tijuca, que hoje não se parece com a Tijuca
da minha época, tradicional. Com a chegada do metrô houve uma popularização do
bairro, crescimento do comércio e a favelização nos morros da região. A Praça
Saens Peña tinha 11 cinemas no seu entorno. Isso acabou. A nossa praia era a da
Barra, que é da Tijuca! (risos). Pela Tijuca eu era torcedor do América! Sou
Flamengo, mas tenho até hoje o América no meu coração. Vim para Copacabana
quando casei com uma moça daqui e vi que a Tijuca não era mais a mesma. Aqui
tive minha filha e me adaptei.
J.C.: O que tem de bom em Copacabana que fez com que se
adaptasse?
I.R.: Tudo! Hoje não tem mais os cinemas, isso eu lamento.
Não tem um grande shopping com praça de alimentação, isso também lamento, mas
tem gente! O que me prende é isso: estar perto de gente, do comércio, a
segurança que o bairro oferece. O que me atrai em Copacabana é o movimento que
tem no bairro. Moro em frente a uma mata, mas saio de casa e lá está a
movimentação. Copacabana tem sossego e caos! Trabalhei aqui durante muitos anos e tenho apego pelas
pessoas, pelas aspirações, convivi muito com os moradores do bairro e acabei me
envolvendo.
J.C.: Que recado deixa aos leitores do Jornal Copacabana?
I.R.: Queria agradecer à equipe do Jornal pela entrevista,
por me considerarem um vizinho ilustre, mesmo sem exercer nenhum cargo no
bairro nesse momento. Que as carências do bairro sejam percebidas e resolvidas
pelos nossos governantes: problemas como a população de rua, que ainda atinge
Copacabana e pode melhorar, atenção com a prostituição, com a educação para que
as coisas ruins não aconteçam. E que haja o fortalecimento dos conselhos
comunitários e AISPs (Áreas Integradas de Segurança Pública), que é para onde
vão os pedidos de melhorias do bairro.
Fotos e texto reproduzidos do site:
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