quinta-feira, 25 de julho de 2013

Ivo Raposo, o dono do cinema Centímetro, em Conservatória

 Ivo Raposo.


Ivo Raposo, o dono do cinema Centímetro, em Conservatória
Por Renata Moreira Lima
Fotos: Renata Moreira Lima e divulgação
  
Quem viu o clássico Cinema Paradiso vai encontrar semelhanças entre a história do filme e a vida do advogado Ivo Raposo. Morador de Copacabana, esteve à frente da 12ª e 13ª delegacia do bairro, mas era pelo cinema que o ex-delegado manifestava sua grande paixão. Nascido na Tijuca e frequentador do antigo cinema Metro, ficou com o parte do acervo do cinema e montou o Centímetro (um mini Metro) no quintal da casa em Conservatória, interior do estado do Rio de Janeiro. Hoje, o local faz parte do festival Cinemúsica, que acontece todo ano naquela cidade.

Confira na entrevista um pouco mais da história curiosa do vizinho Ivo Raposo.

Jornal Copacabana: Você foi delegado em Copacabana por quase 15 anos. Como vê a transição da sua fase recente e o bairro agora com a criação e instalação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs)?
Ivo Raposo: Durante muitos anos, Copacabana foi agraciada pelo governo por ser um bairro turístico, conhecido internacionalmente, sempre houve uma preocupação grande com a segurança no bairro, que tem duas delegacias e um batalhão de polícia. As UPPs nas comunidades carentes de Copacabana e Leme vieram somar para a melhoria da segurança no bairro, coroando a idéia de que tem que haver segurança em Copacabana, sem esquecer da Zona Norte!

J.C.: Com a saída do bairro você parou com as atividades na polícia?
I.R.: Tenho 38 anos de profissão. Hoje estou na 10ª Coordenadoria Regional de Polícia do Interior, em Barra do Piraí. Toda vez que há necessidade de operação por lá, fico à disposição. Felizmente as delegacias do interior não sofrem com os altos índices de criminalidade.
  
J.C.: Como a estratégia para instalação das UPPs se deu de maneira pacífica, alguns infratores teriam migrado para o interior. Como está a situação em Barra do Piraí e região?
I.R.: Não temos evidências de que houve migração dos infratores para aquela área. Os índices de criminalidades de lá não sofreram alteração depois da instalação das UPPs na cidade do Rio de Janeiro. Mas estamos sempre atentos a esse ponto para que não aconteça.

J.C.: Mesmo atuando na Polícia você tem uma ligação direta com o cinema. Como surgiu o interesse por esse assunto?
I.R.: Meu pai era detetive, se aposentou após 44 anos de serviço. Vivenciei aquele ambiente da vida de um policial, nasci respirando a polícia! A explicação está na evolução, ao longo do tempo, mas gosto de cinema desde criança. Dos 12 anos aos 18 anos fui projecionista de um cinema da Igreja Santo Afonso, na Tijuca. Quem viu o filme Cinema Paradiso, viu a história da minha vida! (risos). Era muito legal! O padre fazia censuras e eu cortava os fotogramas. (risos). Trabalhei por hobbie durante esse tempo, pois não ganhava muito dinheiro e, se continuasse nesse ramo, não ganharia nunca! Solitário na cabine, fazia as tarefas do colégio, me formando com tranqüilidade no segundo grau e parei com a atividade no cinema quando entrei para a faculdade de Direito, já pensando em seguir a carreira na polícia.

J.C.: Como reencontrou essa paixão?
I.R.: Parei com a atividade de projecionista, mas ela não saiu do meu coração e da minha vida! Terminei o curso de direito e fiz concurso para Comissário de Polícia (Delegado da época). Foi aí que o amor pelo cinema começou a me fazer bem, era uma válvula de escape da tensão de trabalhar na polícia. Eu extravasava com o cinema! Era o sonho e a realidade. A polícia lida com o que há de pior na sociedade, o cinema reduzia o meu desgaste. A minha paixão é tanta que minha filha seguiu para esse lado do cinema.

J.C.: Como conseguiu o material do Cinema Metro e como surgiu a idéia de criar o Centímetro (uma miniatura do Metro) na cidade de Conservatória?
I.R.: A minha paixão pelo cinema não se limitava a assistir aos filmes, queria saber do processo, que máquina era essa que mexia com o nosso lúdico. Tem cineasta hoje em dia que nunca viu um projetor de cinema! Quando trabalhei como projecionista, lidava com o pessoal da Metro e de outras companhias. Quando o cinema Metro da Tijuca fechou, pensei que, infelizmente, o material cinematográfico poderia ter um fim trágico e comecei a pedir para ficar com o que sobrou dele. O curador daquela massa falida tentou vender para o ferro velho, mas não era ferro, ele não conseguiu e acabou entendendo que o material poderia ficar comigo. Levei para a casa do meu pai em Conservatória, restaurei algumas peças, ainda fiquei com poltronas e tapetes do Metro. Resolvi refazer o cinema em Conservatória.

J.C.: Assim lançou o Centímetro?
I.R.: Eu jamais conseguiria o espaço do tamanho que era o Metro. Por isso criei o Centímetro! (risos).

J.C.: É aberto para o grande público?
I.R.: Na verdade fiz para os amigos e família, mas hoje tenho um acordo com os hoteleiros da região e fazemos sessões demonstrativas para os visitantes que estão hospedados nos hotéis de lá. É no quintal da minha casa e agora faz parte do roteiro turístico.

J.C.: Conservatória, que já tinha um turismo artístico através das serestas...
I.R.: Pois é. Por isso entrei com o Centímetro no evento Cinemúsica, que acontece todo ano. A quinta edição será em setembro. Sempre colocamos duas telas nas praças da cidade, mais o Centímetro para apresentar os filmes durante o festival e fazemos premiações. A música e o cinema são acompanhados de gastronomia. Todo ano convidamos chefes de restaurantes do Rio para darem um charme a mais ao evento.

J.C.: Gosta, acompanha e incentiva o cinema. Como vê o processo cinematográfico brasileiro?
I.R.: A indústria nacional teve um “boom” nos últimos anos, com leis de incentivo estimulando recursos para realização de filmes de qualidade. Evoluiu e aprimorou suas técnicas. Hoje entendemos os diálogos, sob esse aspecto, melhorou muito. Aliado ao sistema digital, até pelo custo benefício, a tendência é a extinção da película.

J.C.: Sendo assim, você tem mais uma relíquia!
I.R.: É! (risos). E o Centímetro vai ganhando cunho de Museu.

J.C.: Nasceu na Tijuca, tem o Cinema em Conservatória, trabalha em Barra do Piraí, como veio morar em Copacabana? Como divide o seu tempo?
I.R.: Cresci na Tijuca, que hoje não se parece com a Tijuca da minha época, tradicional. Com a chegada do metrô houve uma popularização do bairro, crescimento do comércio e a favelização nos morros da região. A Praça Saens Peña tinha 11 cinemas no seu entorno. Isso acabou. A nossa praia era a da Barra, que é da Tijuca! (risos). Pela Tijuca eu era torcedor do América! Sou Flamengo, mas tenho até hoje o América no meu coração. Vim para Copacabana quando casei com uma moça daqui e vi que a Tijuca não era mais a mesma. Aqui tive minha filha e me adaptei.

J.C.: O que tem de bom em Copacabana que fez com que se adaptasse?
I.R.: Tudo! Hoje não tem mais os cinemas, isso eu lamento. Não tem um grande shopping com praça de alimentação, isso também lamento, mas tem gente! O que me prende é isso: estar perto de gente, do comércio, a segurança que o bairro oferece. O que me atrai em Copacabana é o movimento que tem no bairro. Moro em frente a uma mata, mas saio de casa e lá está a movimentação. Copacabana tem sossego e caos! Trabalhei aqui durante muitos anos e tenho apego pelas pessoas, pelas aspirações, convivi muito com os moradores do bairro e acabei me envolvendo.

J.C.: Que recado deixa aos leitores do Jornal Copacabana?
I.R.: Queria agradecer à equipe do Jornal pela entrevista, por me considerarem um vizinho ilustre, mesmo sem exercer nenhum cargo no bairro nesse momento. Que as carências do bairro sejam percebidas e resolvidas pelos nossos governantes: problemas como a população de rua, que ainda atinge Copacabana e pode melhorar, atenção com a prostituição, com a educação para que as coisas ruins não aconteçam. E que haja o fortalecimento dos conselhos comunitários e AISPs (Áreas Integradas de Segurança Pública), que é para onde vão os pedidos de melhorias do bairro.

Fotos e texto reproduzidos do site:

Nenhum comentário:

Postar um comentário