sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

Grande Retorno do Cine Penedo



Publicado originalmente no site da REVISTA ALAGOANA, de 21 de janeiro de 2024

Após 40 anos: antigo projecionista comemora retomada das atividades do Cine Penedo

Por: RevistaAlagoana

Categoria: Reportagens

Data da postagem: 21/01/2024

Cine Penedo reabre as portas ao público, em movimento renascentista dos cinemas de rua no Brasil

Gabriely Castelo e Raphael Medeiros

Grande Retorno. Entre os dias 13 e 19 de novembro, o Circuito Penedo de Cinema, acontecerá em um gigante da sétima arte, que até então estava desativado. O Cine Penedo retorna ao público em grande estilo, recebendo um dos maiores festivais de cinema do mundo. A 13ª edição reaquece o crescimento dos cinemas de rua em todo país.

Com uma voz grave, já avançada, Seu José Luiz Passos, 77, carrega muita sabedoria na fala. Ele é radialista e “ex-operador cinematográfico”, como disse. Bem humorado, gente finíssima e auto-intitulado “véinho” (com muitos risos), ele conversou com a Revista Alagoana e contou detalhes dos bastidores do dia-a-dia cinematográfico de Penedo.

“Pouca gente aqui [em Penedo] sabe o que é um filme, porque o cinema fechou em 93. De lá pra cá, quantos milhares nasceram? E não conhecem, não sabem, não viveram.” comenta seu José Luiz Passos, ex-operador cinematográfico do Cine Penedo.

Após um intervalo de 40 anos, o Cine Penedo está prestes a reabrir suas portas durante a estreia do Circuito Penedo de Cinema 2023, marcando um emocionante e importante renascimento dos cinemas de rua, em Alagoas.

Seu Luiz compartilha suas memórias da época em que o cinema era o epicentro cultural da região.

“No final dos anos 50, nós recebíamos os filmes da capital, de Maceió, vinham em estrada de barro. O carro saía às 7, 8 horas da manhã, chegava aqui às vezes 9, 10h da noite, principalmente se fosse a época invernosa, era barro e piçarra vermelha, o carro atolava e deslizava, o povo tinha que descer, e havia um atraso”, diz seu Luiz, relembrando à época analógica.

“O ônibus nem precisava ir para a rodoviária, já que estava atrasado.” O operador conta, com nostalgia, as histórias do tempo em que era o encarregado de buscar e exibir as películas aos penedenses.

Luiz descreve vividamente os desafios desse leva e trás, dos filmes de Maceió à Penedo, onde estradas de terra ligavam todo o caminho percorrido. Apesar das dificuldades, a comunidade estava sempre presente. Todos se reuniam em frente à telona, para assistir a uma variedade de filmes nacionais e clássicos, criando uma experiência cultural única. “Aviso aos Navegantes”, “Oscarito”, “Matar ou Morrer”, “Zorro”, “Os Poderes de Ninhoca”, “As Aventuras de Doutor Satã” e muitos outros títulos foram projetados pelo à época, jovem Luiz.

Curiosamente, ele contou à reportagem que também eram exibidas séries, com intervalos semanais e tudo que estamos acostumados hoje, porém, sem nada on demand- se perdesse a sessão, teria que perguntar aos amigos e conhecidos. A cidade inteira se reunia, no Cine Penedo, para assistir às estreias toda semana.

“O bandido ficava tentando matar o artista, o bandido prendia o artista e a gente, na outra semana, voltava com todo mundo para ver como tinha ficado. Todo mundo queria ver o andamento das coisas. Foi um tempo muito bom de aprendizado como profissional, com muito aproveitamento cultural. Assisti muitos filmes bons, muitos filmes épicos. Como Os 10 Mandamentos, que foi uma grande movimentação na cidade.”, relembra.

Dado o enorme público, no primeiro dia da exibição de “Os 10 Mandamentos”, foram feitas duas sessões naquela noite.

“A sala encheu, não tinha ventilador, não tinha ar condicionado. O povo suava como uma tampa de chaleira, mas entrou, ficou e assistiu mais três horas de Os 10 Mandamentos”, recorda com alegria.

Era uma garotada, um perfil coletivo, tinha todo tipo de gente. Cinema é cinema, é a sétima arte. Todo mundo andava em fileiras, em direção aos seus assentos. Cartazes eram distribuídos na cidade, em pontos bem estratégicos. Penedo tinha o melhor cinema do norte-nordeste.

Hoje em tempos de filmes de super-heróis, o ex-operador recorda o tempo em que a moda “da garotada” era outra. Ele conta que frequentava o Cine não só para assistir os filmes de cowboy. “Eu vinha aqui para ouvir, é bonito! A bala ricocheteando lá nas pedras.”

Se a trama fosse épica, aí era “da intelectualidade”, diz Seu Luiz, o que apelidamos de “cinema cult” hoje em dia.

Atualmente, uma sala de projeção de cinema não é nada como antes, nem de perto é tão complicada quanto foi um dia. Os projetores não tem mais a mesma altura de um humano e a sala é bem mais geladinha. Ninguém melhor para comentar o assunto que o responsável pela área em Penedo.

“Eu conheci todo o equipamento. O engenheiro lá fez uma demonstração pra mim, diferente daqueles gigantes mecânicos que nós trabalhávamos.”

Porém, quando perguntado sobre a modernização, a adaptação do público aos serviços de streaming, a resposta não foi nada animadora. Amante de cinema, Seu Luiz comenta, com a voz tristonha com os novos tempos e sinaliza que o ato de ir ao cinema, será algo nichado, “para quem ama ir ao cinema”.

Painel que ficava no Cine Penedo; Seu Luiz diz reconhecer ao menos 3 das damas. Foto: Cortesia

“Por mais que queira modernizar, não vai ter o lugar de volta[O cinema]. Isso está sacramentado. O cinema não vai mais ser um líder para pegar o seu público, o seu espectador habitual.”

E finaliza, comentando o conforto que os serviços de streaming à ponta dos dedos dão a todos:

“Você podendo assistir em casa, no conforto do televisor de 70 polegadas, com a qualidade sonora a seu gosto. Você bota agudo, grave, médio, e assim vai. O cinema vai ficar, com toda essa tecnologia moderna, vai ficar um nome. Cinema. Cinema.”

Circuito Penedo de Cinema

Depois de tanto tempo inativo, o prédio foi adquirido pelo IPHAN Alagoas e cedido à Universidade Federal de Alagoas (Ufal), para promover a retomada da produção audiovisual em Penedo. A restauração do local histórico foi financiada pelo BNDES, marcando um renascimento do cinema na região. Pioneiro da sétima arte no Baixo São Francisco alagoano, funcionou de 1950 a 1980- trinta anos de ouro, que diga Seu Luiz.

Texto reproduzido do site: revistaalagoana com

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